O Conselho
Permanente da CNBB aprovou e divulgou na tarde desta quinta-feira, 7 de março,
uma Carta Aberta à população brasileira para fazer sérias denúncias a respeito
do modo como está sendo encaminhado o processo de elaboração do novo Marco
Regulatório da Mineração no país.
Leia a Carta:
A necessidade
de reformular a atual lei que regulamenta a mineração no nosso país levou o
governo a elaborar o novo Marco Regulatório da Mineração que, brevemente,
deverá ser enviado para aprovação do Congresso Nacional. Nós, bispos do
Conselho Permanente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil-CNBB,
reconhecendo a importância da atividade mineradora e a sua regulamentação,
julgamos oportuno trazer a público nossas preocupações com relação à nova lei
que está sendo proposta.
Devido à
amplitude da lei, consideramos de fundamental importância que se promova um
amplo debate com a sociedade e as populações a serem impactadas pelas
atividades mineradoras. A ausência do debate público, percebido até o momento,
impede a população de conhecer e opinar sobre assunto de grande relevância
social e ambiental, que tem efeitos diretos em sua vida.
Vivemos numa
crescente demanda por apropriação dos bens naturais em nível global,
transformando-os em mercadoria e assumindo-os como uma oportunidade de
negócios. O governo, por sua vez, vê na extração mineral um dos pilares para
sustentar o modelo de desenvolvimento econômico em curso no país, baseado no
sistema de commodities.
O aumento de
preços dos minérios desperta o interesse tanto do governo quanto das
mineradoras, tornando-se, assim, motivação maior para o novo Marco Regulatório
da Mineração. Reconhecido seu interesse público, a nova lei, acima de tudo,
prioriza o aspecto econômico da extração mineral, em detrimento dos aspectos
sociais, ambientais, espirituais e culturais dos territórios e de suas
populações.
Preocupa-nos a
proposta, no novo Marco Regulatório, da criação das áreas de relevante
interesse mineral e das regiões de interesses estratégicos. Nestas áreas a
mineração seria feita a partir de procedimentos especiais que podem ferir o bem
comum, além de provocar uma inversão de prioridade entre os direitos individuais
e coletivos e o interesse econômico, público e privado.
A exploração
mineral é uma atividade que provoca impactos em povos, comunidades e
territórios, gerando conflitos em toda sua cadeia: remoções forçadas de
famílias e comunidades; poluição das nascentes, dos rios e do ar; degradação
das condições de saúde; desmatamento; acidentes de trabalho; falsas promessas
de prosperidade; concentração privada da riqueza e distribuição pública dos
impactos; criminalização dos movimentos sociais; descaracterização e
desagregação sociocultural.
Esclareça-se
que “a programação do desenvolvimento econômico deve considerar atentamente a
necessidade de respeitar a integridade e os ritmos da natureza, já que os
recursos naturais são limitados e alguns não são renováveis” (João Paulo II, A
solicitude social n. 26). “Toda utilização da natureza, todo o progresso
ou desenvolvimento econômico feito às custas de sua destruição está marcado
pela loucura que gera morte” (Nota da CNBB ‘Ouvir o eco da vida’ – 1992).
A mineração em
terras indígenas é outra grave preocupação suscitada pelo Projeto de Lei
1.610/96, tramitando no Congresso sem nenhuma interação com o Estatuto dos
Povos Indígenas, que espera aprovação desde 1991. O Projeto de Lei 1.610/96
desrespeita totalmente a autonomia dos povos indígenas sobre seus territórios,
assegurada pela Constituição Federal e pela Convenção 169 da Organização
Internacional do Trabalho, da qual o Brasil é signatário. As mesmas ameaças
recaem sobre comunidades quilombolas, populações tradicionais, pequenos
agricultores e áreas de proteção ambiental.
O
desenvolvimento não justifica tudo e não é verdadeiro quando reduzido “a um
simples crescimento econômico”. Para ser autêntico, recorda-nos o Papa Paulo
VI, “o desenvolvimento deve ser integral, quer dizer, promover todos os homens
e o homem todo” (Populorum Progressio, n. 14), buscando o equilíbrio e a
integração de toda a criação.
Diante disso,
solicitamos aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário que:
a) Seja instituída uma etapa prévia
de debates na sociedade civil sobre o conteúdo da nova Lei da Mineração,
anterior à sua apreciação pelo Congresso Nacional;
b)
A reforma da lei geral da Mineração considere em primeiro lugar os interesses
das comunidades ocupantes dos territórios passiveis de atividade mineral;
c) A
discussão do Projeto de Lei 1.610/96 sobre mineração em terras indígenas seja
vinculada à aprovação prévia do Estatuto dos Povos Indígenas.
Conclamamos as
pastorais, os movimentos sociais, as entidades de defesa dos direitos humanos,
econômicos, sociais, culturais e ambientais, bem como todas as pessoas de boa
vontade a se unirem numa plataforma comum de debate sobre os impactos da
mineração. Insistimos que acompanhem as comunidades atingidas, assegurando que
toda atividade mineradora e industrial tenha como parâmetro o bem estar da
pessoa humana, a superação dos impactos negativos sobre a vida em todas as suas
formas e a preservação do planeta, com respeito ao meio ambiente, à
biodiversidade e ao uso responsável dos bens naturais.
Deus, que nos
fez cuidadores da terra e de toda a criação (cf Gênesis 1,28), nos torne
zelosos cumpridores desse dever.
Brasília-DF,
07 de março de 2013
Dom José
Belisário da Silva
Arcebispo de
São Luís do Maranhão
Presidente da
CNBB em exerício
Dom Sergio
Arthur Braschi
Bispo de Ponta
Grossa – PR
Vice-Presidente
da CNBB em exercício
Dom Leonardo
Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar
de Brasília
Secretário
Geral da CNBB
Fonte: CNBB